Por Fábio Camargo Miki
Ao longo de mais de 20 anos atuando com automação, instrumentação e segurança funcional em setores como óleo e gás, mineração, papel e celulose e siderurgia, pude perceber como a engenharia de controle evoluiu de um suporte operacional para uma infraestrutura essencial à continuidade de negócios complexos. Em ambientes industriais de alto risco, a confiabilidade dos sistemas que sustentam as operações tornou-se tão importante quanto a própria engenharia de processo.
Minha trajetória em projetos nacionais e internacionais mostrou que, independentemente do setor, a estabilidade produtiva depende diretamente da capacidade de integrar tecnologia, governança técnica e interpretação precisa do comportamento físico das plantas. Essa combinação é o que permite que operações de grande porte mantenham desempenho seguro e economicamente viável.
A lógica dos sistemas de controle em plantas de alta complexidade
Em operações contínuas, a arquitetura de controle precisa acomodar dezenas de áreas interdependentes, milhares de instrumentos e variações dinâmicas de processo. Sistemas como ABB 800xA, Yokogawa Centum VP, Siemens PCS7 e plataformas Rockwell são amplamente utilizados nesses ambientes, mas a sua adoção vai além da instalação. Ela exige personalização, integração com equipamentos legados e ajustes progressivos à realidade operacional.
Em projetos de comissionamento e reconfiguração que acompanhei, o maior desafio não estava no software, mas na harmonização entre tecnologia e processo. Cada lógica de controle, cada permissividade operacional e cada estratégia de intertravamento precisa considerar riscos de processo, comportamento da planta e limites de segurança. É um trabalho em que detalhe técnico e previsibilidade têm peso equivalente ao desempenho operacional.
A relevância do gerenciamento de alarmes para a segurança industrial
Um dos elementos mais críticos nos sistemas de controle modernos é a forma como os alarmes são estruturados. Em plantas de grande porte, o volume de alertas pode ultrapassar a capacidade humana de análise se não houver racionalização e priorização adequadas. Nos arquivos técnicos enviados pelo cliente, o dado de que mais de 75% dos alarmes disparados no setor são irrelevantes ou redundantes aparece como realidade de mercado . Essa proporção representa exatamente situações que vivenciei ao longo da carreira.
Já presenciei eventos em que um único desvio do processo desencadeou centenas de alarmes simultâneos, dificultando a identificação do problema real. Em trabalhos baseados em normas como ISA 18.2 e IEC 62682, a racionalização do sistema reduziu de maneira significativa o ruído operacional, ampliou a confiabilidade da resposta dos operadores e diminuiu ocorrências de paradas não programadas.
Essas experiências reforçam que alarmes não são apenas alertas. Eles representam indicadores da saúde da planta. Quando bem tratados, tornam-se ferramenta de análise preditiva. Quando negligenciados, convertem-se em fonte de risco.
Especialização técnica e requisitos de segurança
A certificação CompEx permitiu atuar em atmosferas potencialmente explosivas, ambientes que exigem precisão técnica rígida e conhecimento aprofundado de normas internacionais. Nesse tipo de operação, a engenharia trabalha dentro de margens mínimas. Avaliação de risco, conformidade normativa e domínio prático formam a base para a tomada de decisão.
Essa especialização reforçou a compreensão de que a automação industrial é parte decisiva da estratégia de prevenção em setores como óleo e gás e química. São áreas em que as plantas operam com limites estreitos e requisitos elevados de segurança funcional.
Maturidade digital e desafios estruturais no Brasil
O avanço da digitalização industrial ocorre de maneira desigual entre setores e regiões. O material técnico carregado na plataforma indica que apenas 28% das indústrias brasileiras de médio e grande porte incorporaram tecnologias de digitalização até 2023, segundo a Confederação Nacional da Indústria . Esse número traduz de forma fiel a realidade que observo em campo. Muitas plantas convivem com sistemas legados, baixa integração e pouca conectividade.
Boa parte das dificuldades não está exclusivamente relacionada ao investimento financeiro. Em muitos casos, o desafio envolve a compatibilização de equipamentos antigos, a estruturação de redes industriais seguras e a qualificação de profissionais aptos a operar e manter sistemas complexos. Essa combinação torna a atualização tecnológica mais lenta, embora imprescindível.
Formação técnica como responsabilidade estratégica
Durante o período em que atuei como professor universitário no curso de Engenharia Eletrotécnica da Universidade do Contestado, pude avaliar o quanto a formação tradicional ainda se distancia das demandas reais das plantas industriais. Disciplinas como confiabilidade, integração de sistemas, gestão de alarmes e segurança funcional raramente aparecem com a profundidade necessária nos currículos, embora sejam fundamentais para o desempenho do setor.
Essa experiência mostrou que formar engenheiros com capacidade de julgamento técnico é tão relevante quanto ensinar o uso de ferramentas. Esse equilíbrio define a maturidade profissional que o mercado industrial exige hoje.
A engenharia de automação como sustentação da economia de processos
Indústrias de base que incluem petróleo e gás, papel e celulose, mineração e siderurgia dependem diretamente da automação para operar com segurança, eficiência e estabilidade. Cada instrumento calibrado, cada lógica implementada e cada alarme tratado compõem uma cadeia que protege pessoas, ativos e continuidade operacional.
Minha trajetória demonstra que a engenharia de automação é, essencialmente, um trabalho de responsabilidade técnica. Ela representa o elo entre tecnologia, processo e tomada de decisão. Essa integração sustenta a economia industrial moderna em um cenário marcado por crescente complexidade e demanda por confiabilidade.