Evento marca a escolha do acervo do APESP como Patrimônio Documental da América Latina e o Caribe reconhecido por entidade da ONU
O Comitê Regional para a América Latina e o Caribe do Programa Memória do Mundo da Unesco (MoWLAC ) vai entregar, no próximo dia 16 de maio, os certificados de inscrições dos dois únicos acervos brasileiros selecionados em 2024 — um deles é a “Presença Negra no Arquivo: Luiz Gama, articulador da liberdade (1830-1882)”, apresentada pelo Arquivo Público do Estado de São Paulo (APESP).
O evento será realizado no auditório do APESP, em São Paulo, contará com a presença de representantes das candidaturas certificadas, da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) e de outras autoridades.
Além da candidatura do acervo Luiz Gama, o outro acervo selecionado são as “Atas do Montepio Geral de Economia dos Servidores do Estado, atual MAG Seguros – O início da seguridade social- 1835”, apresentada por MAG Seguros e Previdência S.A.
A candidatura do Arquivo Público do Estado reúne o conjunto documental sobre o abolicionista, jurista, escritor e jornalista Luiz Gama, a partir de nove periódicos que abordam sua atuação, incluindo o livro “Matrículas de Africanos Emancipados” de 1864, que contém manuscritos assinados por Gama. O conjunto inicial foi identificado pelo pesquisador do Instituto Max Planck, Bruno Rodrigues de Lima, fundador da Sociedade Luiz Gama e organizador das obras completas do abolicionista, premiado pelo Jabuti Acadêmico de 2024, com o volume “Direito 1870 – 1875: Luiz Gama” (Ed.Hedra).
“A recente decisão da Unesco é uma justiça histórica, reconhecendo a grandiosidade da obra de Luiz Gama, maior jurista do mundo moderno. Esta conquista é fruto do esforço da sociedade civil e do Estado de São Paulo, cuja missão é resgatar e recuperar esse legado custodiado pelo Arquivo Público”, comenta Bruno Lima.
O acervo de Luiz Gama é o sexto conjunto documental custodiado pelo APESP a ser reconhecido, em diferentes níveis, pelo Programa Memória do Mundo da UNESCO. No contexto nacional, já foram reconhecidos o Fundo Comissão Teotônio Vilela de Direitos Humanos (1983-2016), o Arquivo da Secretaria de Governo da Capitania de São Paulo (1611-1852), o jornal abolicionista “A Redempção” (1887-1899) e os Livros de Registro de Matrícula dos Imigrantes, do Memorial do Imigrante do Estado de São Paulo (1882-1973). No âmbito nacional, o arquivo do Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo – DEOPS (1964-1985) também foi certificado.
Luiz Gonzaga Pinto Gama (1830–1882), gigante na luta contra a escravidão no Brasil, nasceu livre em Salvador (BA), mas foi vendido como escravizado pelo próprio pai e levado ao Rio de Janeiro, sendo depois revendido e forçado ao trabalho em São Paulo. Autodidata, aprendeu a ler aos 17 anos e, com o tempo, construiu uma carreira brilhante: atuou como copista, amanuense e, mais tarde, advogado. Frequentador assíduo da biblioteca da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, acumulou vasto conhecimento jurídico sem nunca ter sido formalmente acadêmico.
Gama destacou-se na imprensa como articulista e nos tribunais como defensor incansável da liberdade, conseguindo libertar mais de 500 pessoas escravizadas — entre seus feitos mais emblemáticos está a vitória que garantiu a liberdade de 217 cativos em um caso que chegou ao Supremo Tribunal de Justiça. Parte fundamental de sua trajetória está preservada: ele foi responsável pela reprodução de mais de 120 cartas de alforria, hoje guardadas em arquivos públicos, documentos que eternizam seu legado e sua luta pela justiça. Reverenciado em vida e homenageado em sua morte, Luiz Gama permanece como um dos maiores nomes da história da abolição no Brasil.
Para o diretor do APESP, Thiago Lima Nicodemo, verifica-se que o Arquivo reúne uma das maiores coleções de escritos jornalísticos produzidos pelo abolicionista Luiz Gama, refletindo uma parte significativa de seu pensamento que influenciou consideravelmente a história brasileira. “Com este registro no Programa Memória do Mundo pretendemos ampliar a divulgação da vida desta personalidade e possibilitar a inclusão de novos documentos sobre o advogado, que atualmente estão dispersos. Este reconhecimento deve-se à sua existência enquanto sujeito e à sua presença difusa nos documentos, refletindo seu pensamento e influência na história brasileira. Este reconhecimento não só ressalta a importância do abolicionista Luiz Gama, mas também marca um passo significativo do recém instituído Programa Presença Negra no Arquivo”, explica Nicodemo, sobre a relevância dessa conquista.
Durante o evento, a exposição temporária “Eu, amanuense que escrevi…”, em homenagem ao abolicionista Luiz Gama, será inaugurada. Após a entrega dos certificados, os apoiadores das candidaturas serão convidados a participar da cerimônia, que contará ainda com uma mesa de conversa com Bruno Lima, Ednusa Ribeiro, do Arquivo do Estado e Meninas Mahin, Ligia Ferreira, da Fundação Bienal de São Paulo e a Universidade Federal de São Paulo.
O programa Memória do Mundo, criado pela UNESCO em 1992, visa promover a conservação e o acesso ao patrimônio documental da humanidade, enfrentando desafios como tempo, falta de recursos, guerras e comércio ilegal de documentos. O Comitê Regional para a América Latina e o Caribe, criado em 2000, tem como objetivo preservar o patrimônio documental da região, e até agora reconheceu cerca de 233 inscrições de conjuntos documentais custodiados em Arquivos, Bibliotecas, Museus, entre outros, da América Latina e Caribe.
Serviço
Evento: Acervo do Arquivo Público sobre o abolicionista Luiz Gama é chancelado como Patrimônio Documental da América Latina e o Caribe no Programa Memória do Mundo da UNESCO Latina e Caribé.
Data: 16 de maio
Horário: das 14h às 19h
Local: Auditório do Arquivo Público do Estado (Rua Voluntários da Pátria, 596 – Santana)