Com o avanço da fiscalização digital e cruzamento de dados pela Receita Federal, manter a empresa em dia com o Fisco deixou de ser apenas uma obrigação. Tornou-se uma questão de sobrevivência — e uma poderosa vantagem competitiva
Empresas brasileiras enfrentaram, somente em 2024, um volume recorde de autuações fiscais: foram mais de R$ 212 bilhões em autos de infração, segundo dados da Receita Federal. As principais causas? Erros de escrituração, regime tributário inadequado e o descuido com obrigações acessórias. Um levantamento da FENACON mostra que quase 40% das pequenas e médias empresas (PMEs) não realizam revisão tributária periódica — o que as expõe diretamente a multas, juros e até ao bloqueio de suas atividades.
É nesse cenário que o conceito de compliance fiscal vem ganhando espaço como uma das principais ferramentas de proteção patrimonial e crescimento estratégico no Brasil.
“Compliance não é algo reservado às grandes corporações. Pequenas e médias empresas também precisam estar em conformidade para crescer de forma sustentável, acessar crédito e evitar prejuízos desnecessários”, afirma a contadora Patrícia Bastazini, fundadora da Bastazini Contabilidade, escritório especializado em contabilidade estratégica e compliance empresarial.
Um problema que começa pequeno — e pode acabar em autuação
Um exemplo emblemático citado por Patrícia foi o caso de uma empresa de e-commerce, optante pelo Simples Nacional, que foi excluída do regime por ultrapassar o limite de receita bruta anual. O detalhe é que o excesso foi causado por um erro contábil no lançamento de notas duplicadas.
“Eles só perceberam quando receberam a notificação da Receita. Ao nos procurar, já haviam acumulado mais de R$ 85 mil em débitos retroativos. Conseguimos fazer a regularização e negociar o parcelamento, mas com um bom controle preventivo, esse problema sequer teria existido”, explica a especialista.
Casos como esse são cada vez mais comuns. Desde 2020, a Receita Federal vem utilizando algoritmos e inteligência artificial para cruzar dados de declarações, notas fiscais eletrônicas, movimentações bancárias, GPS do Simples, SPED e até informações trabalhistas. “Hoje, a Receita é praticamente um Big Brother tributário. Ela cruza tudo, o tempo todo. Qualquer divergência é sinalizada automaticamente”, reforça Patrícia.
Os principais erros que colocam empresas em risco
De acordo com levantamento do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), os cinco principais motivos que levam empresas a sofrerem autuações fiscais são:
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Apuração incorreta de impostos (ISS, ICMS, PIS/COFINS);
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Omissão de receitas ou notas fiscais não lançadas;
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Regime tributário mal escolhido;
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Atraso ou não entrega de obrigações acessórias (DCTF, SPED, EFD);
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Divergências entre informações contábeis e fiscais.
Além disso, muitas empresas ignoram as obrigações trabalhistas e previdenciárias, o que pode gerar passivos ocultos e autuações cruzadas com o eSocial.
A cultura do preventivo precisa se consolidar no Brasil
Para a especialista, o grande desafio está em mudar a mentalidade do empresariado brasileiro: sair da contabilidade reativa e partir para uma contabilidade estratégica e consultiva, com foco na prevenção de riscos.
“Ainda vemos muitos empresários que só procuram o contador quando o problema já estourou. O ideal é o contrário: ter um contador parceiro, que acompanhe o negócio de perto, faça diagnósticos mensais, revise o enquadramento e antecipe possíveis autuações”, defende Patrícia Bastazini.
No escritório fundado por ela, o modelo é claro: toda empresa recebe um diagnóstico fiscal e tributário completo, com mapeamento de riscos, revisão de regime e criação de uma agenda fiscal preventiva. Isso permite evitar surpresas desagradáveis e tomar decisões com base em dados reais.
Compliance como diferencial de mercado
Estar em dia com o Fisco não traz apenas segurança. Traz também vantagens competitivas. Empresas com CNPJ regular têm mais facilidade para:
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Obter linhas de crédito com taxas mais atrativas;
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Fechar contratos com grandes fornecedores e órgãos públicos;
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Atrair investidores, especialmente em rodadas de captação;
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Evitar contingências em processos de fusão ou aquisição.